Hoje adquiri um pedaço de tempo.
Uma moeda de 100 réis, datada ainda dos dias do Império, veio repousar entre meus dedos — leve como a memória, fria como a morte. De bronze escurecido, ela carrega no verso o símbolo da coroa; no anverso, apenas um número cercado por arabescos que o tempo não ousou apagar.
Mas não é só metal. É relíquia.
E, num devaneio inevitável, pus-me a imaginar: o que teria feito com essa moeda o meu melancólico mestre da pena, Álvares de Azevedo?
Talvez a deslizasse entre os dedos pálidos enquanto esperava um café ralo no Café Noite na Taverna, buscando inspiração entre tosses e cigarros. Ou então a trocaria por uma pena nova, para rasgar o papel com versos sobre sepulturas floridas e amores impossíveis. Cem réis, naquela década de 1850, talvez bastassem para comprar um doce, um jornal ou um lampejo de calor humano num bordel de esquina — quem sabe um beijo pago à musa de seu último soneto.
Imagino-o lançando a moeda ao ar, perguntando-se se viveria mais um dia ou se seria, enfim, consumido pela tísica e pelo tédio.
Hoje, ela está aqui, sobre minha mesa, entre um copo de vinho barato e uma vela apagada. Não vale nada — e vale tudo.
Porque com ela comprei um instante de poesia, um delírio imaginado, um encontro impossível com o poeta que morreu aos 20 anos, mas vive ainda em cada sombra deste blog.